Ivan Fernandes, filho de Millôr - Foto: Folha
O mundo literário perdeu na última terça-feira (27) uma das vozes mais críticas e respeitadas desse país, que por mais de 60 anos, criou textos de efeito, usados até hoje em diversas áreas. Desenhista, humorista, dramaturgo, escritor e tradutor, Millôr Fernandes faleceu aos 88 anos, devido à falência múltipla dos órgãos.
No inicio de 2011, Millôr Fernandes sofreu um AVC (Acidente Vascular Celebral) e permaneceu durante longos meses internado em uma clínica do Rio de Janeiro, sua cidade natal, sendo que por duas semanas esteve inconsciente. Após receber alta, em novembro, poucos foram os detalhes sobre a saúde do escritor, até que a notícia de sua morte foi informada no inicio da quarta-feira (28). O escritor faleceu em sua casa, em Ipanema, na Zona Sul do Rio de Janeiro.
Ao longo de décadas, Millôr Fernandes foi considerado uma rara exceção, por conquistar sucesso em todas as áreas em que atuava, sobretudo na literatura e no teatro. Pela sexta arte, publicou mais de 30 livros, incluindo prosas e poemas. Também escreveu peças de teatro - algumas delas publicadas em livros – e musicais, destaque para Liberdade, Liberdade, de 1965, que é considerado um marco no teatro, por possuir críticas a ditadura militar. Além de seus próprios trabalhos, Millôr foi o responsável pela tradução de importantes trabalhos teatrais, como Rei Lear, de William Shakespeare.
O amigo e também cartunista, Ziraldo, foi até a casa de Millôr logo que soube sobre sua morte. Em entrevista, Ziraldo disse que conheceu Millôr Fernandes “aos 15 anos e fiquei sob a sombra dele esses anos todos” e ainda definiu o amigo como um filósofo brasileiro: “Ele foi um grande filósofo brasileiro. Ele fazia uma piada, mas nunca fazia uma piada barata, não era um trocadilho, era uma coisa profunda”. O prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes, também manifestou seu pesar com a morte de Millôr Fernandes e disse sobre a figura do escritor: “Millôr foi uma figura ímpar na história recente dessa cidade, tendo participado ativamente da fundação do Pasquim e da luta intelectual contra a ditadura militar. Mas, principalmente, por ter travado uma batalha incessante contra a ignorância política, os desvios éticos e a "legalização da corrupção", sempre usando o humor afiado como sua principal arma”. Ivan Fernandes, filho do escritor, disse que seu pai gostava de ser notório e não famoso e concluiu dizendo que “perdi não só um pai. Perdi o maior interlocutor que eu tive na minha vida. Não vou encontrar outro à altura dele”.
Algumas pessoas ainda lamentaram a perda de Millôr Fernandes e de Chico Anysio em menos de uma semana, lembrando que o humor feito por Millôr era algo sério e reflexivo. O ator Otávio Augusto comentou sobre o desinteresse das pessoas pelo gênero literário de Millôr Fernandes: “Infelizmente, vindo para cá, perguntei onde estava sendo velado o Millôr e ninguém sabia. O povo não tem acesso a esse tipo de literatura. Era um cara que através do humor fazia uma crítica social”.
O corpo de Millôr Fernandes foi velado no Cemitério Memorial do Carmo, no Caju, Zona Portuária do Rio de Janeiro. Após o velório, o corpo do escritor foi cremado. Ele deixou dois filhos, um neto, além de sua companheira, a jornalista Cora Rónai.

Vida
O escritor foi registrado em 27 de maio de 1924, porém sempre afirmou ter nascido em 16 de agosto do ano anterior. Filho de um engenheiro espanhol, descobriu depois de anos que havia um erro em seu registro de nascimento: o que deveria ser Milton, foi escrito Millôr. Ele gostou e passou a usar esse nome desde então.
Ainda jovem, tornou um leitor assíduo de histórias em quadrinhos, o que lhe incentivou a iniciar seu primeiro desenho, que rendeu uma publicação. Não demorou a ser contratado pela revista O Cruzeiro e também publicar seu primeiro conto na revista A Cigarra, sob o pseudônimo Notlim. Aos poucos ganhou espaço nas principais publicações do Rio de Janeiro, sendo responsável pela coluna Pif-Paf durante dezoito anos. Só em 1962 passa a assinar Millôr, como ficaria respeitado e lembrado por tudo o que fez pela literatura brasileira.

“As pessoas morrem quando você as apaga da sua memória” – Millôr Fernandes.

Millôr Fernandes - 16/08/1923 - 27/03/2012