A Fonte das Mulheres (La Source des femmes)

Resenha: O que você, mulher, faria para obrigar seu marido a lhe substituir e buscar água em um lugar distante e de difícil acesso? Se você imaginou uma greve de sexo você teve a mesma ideia de algumas mulheres retratadas no filme A Fonte das Mulheres, dirigido por Radu Mihaileanu.
Gravado em uma aldeia no Marrocos, A Fonte das Mulheres conta a história de um vilarejo que segue a risca todas as tradições islâmicas, inclusive o fato de a mulher ser responsável exclusivamente pela construção da família, ou seja, pela procriação. Mas como já foi dito, a mulher também tem a obrigação de se esforçar e andar por lugares difíceis em busca do bem mais precioso para o ser humano: a água. Essa tradição está prestes a se perder, principalmente após a chegada de uma mulher jovem e alfabetizada, que tem a esperança de mudar essa tradição.
Leila (Leila Bekthi) não acha certo o esforço que as mulheres fazem enquanto os homens da aldeia ficam o tempo todo bebendo e jogando conversa fora. Tentando encontrar uma solução, Leila propõe as demais mulheres para que evitem as relações sexuais com seus maridos. A maioria acredita que isso não é o certo, afinal, estaria quebrando uma tradição de anos. Ainda assim, Leila conquista o apoio de algumas mulheres que querem fazer a diferença. Começa então uma discussão para procurar a solução deste problema e outras questões envolvendo os costumes e a falta de recursos em lugares como esse vilarejo.
Não é necessário dizer que apesar de parecer estranho esse machismo ainda acontece em países islâmicos. Para se provar isso basta constatar que o diretor se baseou em uma notícia envolvendo uma greve de sexo que causou polêmica no ano de 2001. Por mais absurdo que possa parecer, as mulheres ainda são consideradas objetos sexuais e necessitavam fazer trabalhos que poderiam ser facilmente feitos por homens, como é o caso da busca d’água. Mas não apenas isso que encontramos neste filme co-produzido entre França, Bélgica e Itália.
Os produtores conseguem mostrar com maestria toda uma cultura diferente da nossa e os problemas enfrentados pelas pessoas que seguem uma tradição tão antiga. Em uma vilarejo sem água encanada, a mulher – fonte de tudo, e por isso o título do filme – é forçada a gerar filhos saudáveis e ainda ir em busca de água, muitas vezes se ferindo com isso. A mulher é submissa às tradições e aquelas que se rebelam são tachadas e sofrem um forte preconceito entre a sociedade e entre elas próprias. Em uma cultura que até mesmo a leitura é proibida, que direito pode ter a mulher?
A personagem interpretada perfeitamente por Leila Bekthi é quem tenta mostrar que a mulher possui direitos iguais aos dos homens. Leila – a personagem – é forte, inteligente e tem uma visão mais ocidental (leia: mais livre) da divisão de trabalho e do machismo, tão comum entre islâmicos. Ela sabe que recusar o sexo é a única maneira de fazer o homem mudar seus princípios, o que gera muita discussão. Mas nem todas as mulheres veem isso como uma solução prática.
Uma das poucas que concordam com Leila é a personagem interpretada pela cantora, atriz e dançarina Biyouna, uma mulher sensata que cativa o espectador por seus sentimentos, ensinamentos e também por suas atitudes. Sem dúvidas é a melhor personagem de toda a trama, e Biyouna merece todo o destaque e os elogios por isso.
Conhecemos ao longo de mais de duas horas de filme, um pouco sobre a cultura, incluindo a dança e a música, e também os problemas, como o casamento sem amor, a falta de recursos e principalmente a educação. Se você pensa que a educação de nosso país é ruim, você vai se surpreender na cena em que uma criança pergunta se pode ir à escola. Sim: enquanto aqui os estudantes pedem para faltar, em outras partes do mundo as crianças questionam se devem estudar. Chega a ser estranho, mas é a triste realidade.
Com diversas referências, como as novelas mexicanas e o livro As Mil e uma Noites, A Fonte das Mulheres vem mostrar um problema antigo enfrentado por comunidades islâmicas, principalmente pelas mulheres - o que não deve ser esquecido é que essa cultura merece respeito, apesar de tudo. Com um pouco de humor, romance e ao mesmo tempo muitos ensinamentos culturais, é um filme recomendado. Não possui ação e nem mesmo um ritmo rápido, porém tem algo muito mais importante: a reflexão sobre o tratamento que as mulheres realmente merecem; e o modo da vida de pessoas de uma cultura rica e que também possui seu lado negativo.