No futebol, são raros os jogadores que conseguem conquistar diversas torcidas, como também é raro um jogador passar quase duas décadas em um mesmo clube, recusando propostas que muitos não pensariam muito antes de aceitar. Jogadores como esse acabam conquistando o carinho e admiração de todos, e quando anuncia que está deixando os gramados, deixa também o futebol mais triste, foi o que aconteceu quando Marcos Roberto Silveira Reis, o São Marcos do Palestra Itália, anunciou sua aposentadoria na última quarta-feira (4).
Parecia que o dia 04 de janeiro de 2012 seria marcado apenas pela reapresentação do time principal da Sociedade Esportiva Palmeiras, que iniciaria a preparação para o inicio do Campeonato Paulista e, pelo protesto de parte da torcida alviverde, que pedia por jogadores e criticava diretoria, comissão técnica e claro, o atual elenco. Porém a quarta-feira terminaria de uma forma triste para o futebol brasileiro, quando César Sampaio, ídolo e atual gerente de futebol, anunciasse que Marcão, como é carinhosamente chamado, estava pendurando as chuteiras, e as luvas que tanto deram alegrias ao nosso futebol. “Tivemos uma reunião com o Marcos agora, e ele oficializou que pendurou as chuteiras. Ele disse que ia refletir bastante nessas férias, conversou com os familiares, sinalizou que era o momento de parar e a gente engrandece a pessoa, o que ele representou e representa para instituição” – disse César Sampaio.
Nascido em Oriente, interior de São Paulo, Marcos começou sua carreira no inicio da década de 90, nas categorias de base do Lençoense, da cidade de Lençóis Paulista. Em 1992 se transferiu para o Palmeiras, onde estrearia no time principal naquele mesmo ano, contra a Esportiva de Guaratinguetá. Dali em diante, permaneceria no time paulistano em toda sua carreira, atuando em 532 partidas e se tornando um grande defensor de pênaltis. Um grande ídolo.
Porém naquela época, Marcos era apenas o terceiro goleiro da equipe, e até 1999 atuou em poucos jogos. Foi nesse ano, após uma lesão do goleiro Velloso, que Marcos saiu da reserva para se tornar um dos maiores ídolos do time palestrino, e ainda receber o título de Santo, por suas defesas milagrosas na Copa Libertadores da América de 1999, conquistada pelo Palmeiras. Foi nessa competição que recebeu o prêmio de revelação e de, melhor jogador do torneio.
Alguns meses depois, Marcos disputaria a final do Mundial Interclubes, no Japão, e protagonizaria uma falha que atrapalhou o possível título, mas isso não impediu que ele continuasse sendo um grande jogador. No ano seguinte voltou a fazer história, após partidas inesquecíveis, sobretudo contra o arquirrival Corinthians, na semifinal da Libertadores, quando defendeu um pênalti de Marcelinho Carioca, garantindo assim a vaga na final. Marcos enfrentaria outras disputas de pênalti, na final da Libertadores daquele ano, vencida pelo Boca Jrs., e na semifinal do ano seguinte, quando o Palmeiras perdeu para o Cruzeiro, em nova decisão de pênalti.
Suas atuações, não apenas na competição continental, garantiram sua vaga como titular da Copa do Mundo de 2002, quando o Brasil se sagrou pentacampeão mundial. Marcos foi o único jogador a não ser substituído, e fez defesas que ajudaram o Brasil nessa conquista. Só não foi considerado o melhor goleiro da competição, porque a escolha acontece antes da final, e na oportunidade, Oliver Kahn, goleiro alemão, havia levado apenas um gol até então.
Após o título mundial, Marcos, o time do Palmeiras, e a torcida, passariam por um dos momentos mais tristes de suas histórias: o rebaixamento para a 2ª divisão do Campeonato Brasileiro. Naquela mesma época, devido suas excepcionais atuações, Marcos recebeu propostas de diversos times, entre eles o Arsenal, da Inglaterra, porém São Marcos mostrou porque é um dos jogadores mais queridos da atualidade e ficou no Brasil. Sobre o ocorrido, Marcos comentou: “Deixei de ser apenas um jogador de futebol quando recusei uma proposta de R$ 45 milhões para jogar no Arsenal, da Inglaterra, e preferi disputar a Série B do Brasileiro pelo Palmeiras”.
Marcão continuou sendo um grande ídolo, e um atleta exemplar, no entanto as lesões apareceram em sua carreira e isso impediu que ele se tornasse o atleta que mais vestiu a camisa alviverde em toda a história. Ainda assim, chegou a marca de 532 jogos, sendo o segundo goleiro que mais atuou pelo time, atrás apenas de Emerson Leão, com 617 jogos.
A aposentadoria desse grande ídolo mostrou, mais uma vez que ele é admirado por todos, e isso ficou claro com as palavras de várias pessoas, conhecidas ou não, palmeirenses ou não. Rogério Ceni, goleiro e ídolo do São Paulo, disse: “É triste. O Marcos foi um grande companheiro de Seleção e um grande adversário, de tantos clássicos. Ele sempre foi uma referência nos grandes jogos, eles valiam mais, pois contavam com atletas como ele. Desejo sorte e sucesso nesta nova etapa”. Já o treinador do São Paulo, Emerson Leão, disse: “Fui treinador dele, convivi muito tempo com ele. Agora ele vai ser chamado de professor, porque ele deu uma aula de gol por muitos anos”. O goleiro Oberdan Catanni, outro grande goleiro da história alviverde, também lamentou a aposentadoria do goleiro: “É lamentável. Ele vinha jogando bem, os únicos problemas eram as contusões: quando sarava o braço, era o joelho. Mas ele ainda poderia continuar jogando. Ele nunca foi um jogador extravagante, de passar a noite fora, se comportava como um verdadeiro atleta”.
Além de um grande jogador, São Marcos é também um homem extrovertido, gente boa, atencioso com jornalistas e fãs, tem um jeitão caipira e um grande contador de história. Respeita todos os adversários e por isso é um atleta que todos admiravam, e continuarão admirando, não apenas por seu carisma característico, mas por nunca ter medo de dizer o que pensa e de dar a cara à tapa. Um atleta que vai deixar saudade. Um atleta, que por seu clube, conquistou 13 títulos, além de outros três representando o nosso país. Um atleta completo.
São Marcos não vai deixar saudades apenas para nós, palmeirenses, mas também para todos os amantes do bom futebol. Para todos aqueles que admiram atletas como ele, que por quase duas décadas defendeu um mesmo clube e por quase duas décadas foi um exemplo dentro e fora das quatro linhas.
O futebol sem Marcos dentro de campo nunca mais será o mesmo.
“Tanto tempo que eu fiquei quebrado no vestiário fazendo tratamento para voltar... Eu me quebro tudo de novo, juro por Deus, eu me quebro tudo de novo, mas não vou perder pra essa Ponte Preta nem a pau, nem a pau! Quebro minha perna, quebro meu pescoço se tiver que quebrar dentro dessa merda, mas eu não vou perder, porque eu sei o que eu sofri pra estar aqui e eu sei o que vocês sofreram também. Então véio, eu não vou ter medo de errar, se eu errar foda-se, mas eu vou arriscar, que nem contra o São Paulo, se eu tiver que jogar de líbero eu jogo nessa porra, mas eu não vou perder, eu não vou perder porque a gente sabe o que fez para estar aqui”. – Marcos no vestiário, momentos antes da final do Campeonato Paulista de 2008
Obrigado ídolo!! Obrigado São Marcos de Parque Antárctica!!