A internet e as redes sociais facilitaram a publicação de livros, o que por sua vez também ajudou pequenas editoras a criar e divulgar seus concursos, bem como receber e dar feedbacks aos autores.

Para quem não conhece o formato, antologias são livros de contos, crônicas ou poesias com vários autores onde cada um contribui com pelo menos um trabalho.

Em alguns casos, o tema é livre. Outros são específicos (romance, terror, fantasia, steampunk, etc.). Há também antologias que são organizadas para se produzir um trabalho tão fechado que acaba virando um romance fix up (série de contos que se passa em um espaço igual para todos como uma cidade, um prédio ou um dia específico. O personagem de um conto pode acabar encontrando outro de outro texto), mas são raras. Também há casos de antologias em que você precise trabalhar um elemento em comum com todas (“todos os contos devem ter um personagem cego”, por exemplo), mas também são casos isolados.

As antologias são bons lugares para se começar a praticar a escrita e se acostumar com a pressão de ter o seu nome em uma obra impressa (não que o mercado on-line também não tenha pressão. Mas o que é mais fácil: deletar uma postagem ou remover os exemplares dos pontos de venda?). Muitos novatos já sonham com o seu livro sendo adaptado para o cinema ou sua trilogia... quando mal conseguem escrever um bom texto de cinco páginas. E os concursos são uma oportunidade de ingressar no mercado e realizar o sonho de ver o seu nome como autor (ou melhor, coautor) de um livro.

Infelizmente, nem tudo são flores. Há obras riquíssimas em conteúdo no mercado que são citadas em ótimos blogs, sites e podcasts assim como outras geraram dor de cabeça e desgosto para todos os participantes mesmo sendo impressas (sim. Há casos de antologias que iam ser lançadas e a editora fechou as portas do projeto da noite para o dia sem falar nada a ninguém). E o meu objetivo nesse artigo é apenas conscientizar os leitores sobre a importância de um projeto desses.

1. O editor
O editor é quem comanda A EMPRESA (coloco em Caps Lock para ficar claro a todos). É ele que escolhe os concursos que serão abertos, seus organizadores, seu formato, prazo, capista, revisor, diagramador, gráfica, data de lançamento, envio dos exemplares e outras pautas burocráticas como impressão de novos exemplares, envio e recepção de contratos, registros na Biblioteca Nacional, etc.

Nem todo editor conhece os recursos linguísticos da semiótica semântica ou pragmática, por exemplo. Mas pelo menos ele conhece o mercado (ou deve conhecer) e sabe que sua editora não é fábrica de sonhos. Ela é uma empresa com a qual ele paga suas contas e seus funcionários e há muitas outras no mercado que oferecem o mesmo serviço.

Portanto, se ele não oferece um bom serviço, não confie nele.

E o que seria um bom serviço editorial: o trato com o escritor, seja ele novato ou veterano. Às vezes, algumas editoras têm seus nomes até em sites como Reclame Aqui ou são conhecidas por fazer um trabalho precário em termos de prazo (você manda um e-mail e só é respondido algumas semanas depois, sendo que precisou chamar a atenção do editor nas redes sociais) ou cobram tarifas absurdas. Taxa de inscrição, compra ou venda obrigatória de exemplares ou promessa de que o livro estará nas grandes livrarias do país quando nem o próprio site da editora o anuncia são ações que separam o bom do mau editor.

Solução: sonde o terreno. Pesquise a reputação da editora, procure participantes dela, analise o comportamento do editor com você e outros participantes no decorrer do projeto e veja se é isso mesmo que quer para si. Mais vale a perda de um concurso que a dor de cabeça que você vai ter em entrar em uma canoa furada.

2. O organizador
O organizador é quem comanda A OBRA (novamente, Caps Lock para ser direto). Ele é escolhido pelo editor para comandar o projeto por vários motivos: voto dos autores que já são da editora, convite, oferecimento de seus serviços ou apenas por ser popular (sim! Editores querem pessoas populares para colocar o nome na capa de seus livros. Motivo? Gente popular vende mais! Vivemos em um mundo capitalista, oras!).

Independente de qual seja, é o papel dele orientar os participantes, tirar suas dúvidas a respeito do gênero (conto, crônica ou poesia), indicar obras dentro do gênero/tema, revisar os textos a nível técnico ("como o protagonista cego e sem perícia com armas, conseguiu acertar um tiro? Verifique isso, por favor") e, às vezes, dar uma sugestão no enredo ("esse final está muito previsível. Não pode alterar e salvar o protagonista?").

Qualquer organizador que viva no Brasil sabe das nossas condições precárias de educação escolar. E nem sempre o participante sabe o que é o gênero ou só entende do tema pelo que viu em outras mídias como jogos, filmes, livros ou seriados. Então cabe ao organizador orientar os participantes.

O que fazer: sondá-lo. Ele tem trabalhos publicados em livros ou sites para você avaliar se ele é bom escritor? O que ele sabe do gênero? O que ele conhece do tema? Ele já escreveu algo no gênero/tema? Como ele fará para instruir os participantes: em seu blog, site, canal no Youtube, página pessoal do Facebook, fanpage ou grupo secreto? Ou ele só dedica o seu tempo a dizer três coisas: "está aprovado", "está reprovado" ou "participem da antologia"?

3. O público participante
O editor é confiável? O organizador tem crédito?

Então é hora de você arregaçar as mangas.

Estude o gênero, o tema e a técnica de escrita. Escreva, exponha e reescreva. Mostre a leitores betas ou veja se o organizador tem um tempo para avaliar o seu trabalho antes da última entrega (atenção: organizadores são pessoas ocupadas. Veja com ele se ele topa revisar o texto antes da entrega. Há organizadores que só leem a última versão. Cuidado com o que fala! Não se esqueça que o peixe morre pela boca). Na dúvida, anote informações chave como tema, tamanho do texto, prazo e método de envio e coloque em um papel na parede do seu quarto. Evite perguntar várias vezes “qual é mesmo o prazo?”. Soa muito descompromissado.

Se você achar que está se esforçando demais, é porque está indo bem: se as vagas na antologia forem limitadas e você relaxar, alguém sai na vantagem. Se a antologia não tiver limite de participantes (eu já participei de antologias com mais de 90 pessoas!), é bom se esforçar: algumas pessoas devem estar se empenhando tanto quanto você. E se não estiverem, você vai se destacar por produzir um bom trabalho.

Não deixe de sondar o processo de criação da antologia: se o organizador dá dicas em uma página, veja nos comentários como o público pergunta ou se são apenas um bando de puxa sacos, veja se eles contribuem com material de estudo sobre o gênero/tema e preste atenção o tempo todo no seu trabalho. Lembre-se que a sua vaga ou a sua carreira estão em jogo!

4. A fase pós-lista de aprovados
A lista de aprovados saiu... e você não está aprovado?

Paciência. Agradeça a oportunidade e veja se o organizador não pode lhe dizer onde foi que você errou para evitar o erro no próximo concurso. Seja educado. Nada de “quem é você para recusar o meu trabalho? Você realmente lê literatura em sua mais pura forma?”.

Agora se você foi aprovado... parabéns!

Mas não é hora de amolecer. Receba os contratos, cumpra com o que for pedido e não perca nenhum prazo.

E falando em prazos, veja se a editora cumpre os dela: cada conto podia ter 20 mil toques... e só te deram 3 dias para você ver se a revisão ficou boa bem na época em que você viajou e não deu tempo de olhar? Aí o problema mora dos dois lados: da editora que quer fazer tudo às pressas... e do seu, que não arruma tempo (escritores não têm tempo. Eles arrumam. É diferente).

Então fique atento: editores e autores precisam ter bom senso. É melhor um livro que tem revisão nos contos individuais e no PDF que será mandado para a gráfica do que uma coisa feita às escondidas e sem divulgação que sai uma vergonha no final. É vergonhoso para a editora, para o organizador e para o(s) autor(es)... principalmente quando algum deles têm caráter e vergonha para admitir que erraram.

5. O “day after”
O livro foi lançado... você recebeu seus exemplares... vendeu/doou todos... e agora?

Depois de tudo que você passou na editora X, de dono Y, organizada por Z e com as participações de A, B, C e os demais... vale a pena voltar lá?

Veja bem: se houve algum problema burocrático, de má organização ou algum autor colocou um texto “nada a ver” na antologia enquanto você comeu o pão que o diabo amassou procurando fazer um bom trabalho... vale a pena MESMO voltar?

O que eu quero dizer com isso: a editora não é a única no mercado e você pode procurar outras ou investir no mercado digital. Se você escreveu um bom conto em um livro, veja quanto tempo gastou em sua produção (2 meses, por exemplo) e veja quantos textos pode produzir para ter um livro só seu (2 meses por conto = 12 contos em 2 anos. Dependendo do formato, você já tem um livro só seu).

Valorize a si mesmo e ao seu trabalho. Não é você que está perdendo oportunidades. É a editora que não reconhece que você foi um lutador e a desprezou. Deixe que a empresa afunde por conta própria e continue navegando pelo mar de concursos com segurança, cálculo e felicidade.

Caso fique, não deixe de comparar os projetos da editora com os anteriores. Há editores que se acomodam e não pensam em melhorar gerando um livro pior que o anterior. Dão oportunidade a qualquer um que fale “eu ia fazer uma antologia de romance, mas pesquisei entre amigos e quero fazer uma sobre ninjas. Que tal?” e outros procuram chamar sempre os mais queridinhos para comandar seus projetos mesmo que eles não tenham um pingo de instrução. Consequentemente, tais pessoas não instruem os participantes e você acaba afundando com eles ouvindo coisas como “gostei do seu conto, mas o que veio antes do seu era muito ruim”...

6. Considerações finais
Apesar de tudo que foi dito, participar de antologias é um bom exercício e pode ser uma atividade prazerosa e frutífera quando feita por gente que saiba trabalhar. Mas quando se está entre profissionais, é preciso agir com profissionalismo. Então antes de treinar a sua caligrafia para a tarde de autógrafos, aprimore a sua visão e o seu senso crítico para ver se é isso mesmo que quer para si.

Outro artigo muito bom sobre o assunto: clique aqui.

Vou tirar umas férias e cuidar de alguns projetos. Volto em abril de 2016.

Abraços a todos(as) e continuem escrevendo.

Sobre o Autor
Davi Paiva nasceu em São Paulo, Capital, em 1987. É graduado em Letras pela Universidade Cruzeiro do Sul. Participou de várias antologias da Andross, Terracota, CBJE, Navras, Literata, All Print, Aped e Darda Editora. Publica suas obras em diversos sites, entre eles o recantodasletras.com.br
Contato: davi_paiv@hotmail.com.

8 Comentários

  1. Pois é, participamos juntos nas antologias Horas Sombrias e Legado de Sangue, Davi. Tomo as antologias como oficinas, onde se é permitido o exercício da prática sem o julgamento da obra. Em outras palavras, como são vários autores participando, os erros não recaem sobre um autor apenas, mas fica evidente para que possa ser corrigido.
    Boa matéria. Abraços!

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    1. Oi, Dênis. Beleza?
      Também procurei sempre me aprimorar a cada antologia que participei. Todavia, eu era gota no oceano. E nem todos têm caráter para assumirem que mandaram (muito) mal na antologia.
      Abraços.

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  2. Olá Davi!
    Se esse artigo tivesse saído um pouco antes de eu publicar o primeiro conto em uma antologia, teria ficado mais safa.
    Mas eu consegui me virar e acho que fiz um ótimo trabalho até agora. Vide que fiz umas 4 versões do contos para a Poderes, que eu sei que vai detonar! (JABÁ!)
    Enfim, foram meus primeiros envolvimentos com o mercado editorial e não tenho do que reclamar não. Exceto que algumas vezes eu tive que correr porque alguns prazos foram prolongados e outros encurtados.
    Ficarei com saudades dos seus artigos! Mas aguardarei ansiosa o seu retorno!
    Beijos!

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    1. Oi, Ane. Tudo bem?
      Relaxa que você é uma boa escritora e muito bem empenhada. A Poderes será espetacular (JABÁ [2]!).
      Seja como for, é como eu disse: sonde cada editor e cada organizador. Veja o que foi erro seu quando o projeto deu errado e o que foi erro dos outros. Se gostou, continue.
      Fique fria. Eu voltarei detonando!

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  3. Penso que toda generalização é falha. Há quem diga que antologias são uma perca de tempo, ou um meio de editoras lucrarem, porém, no meu caso, tive uma evolução de 500% do meu processo de escrita, com conselhos, leitores beta, indicações de livos e Blogs, assim como este, que abriram o meu leque de conhecimento, além de conhecer pessoas fantásticas como o Davi Paiva. Sei que tive sorte, já que descobri, indo mais a fundo em estudos sobre antologias, que nem todas editoras e organizadores(as) são empenhados como eu tive, mas ainda assim tirei bons frutos. Antes de o autor entrar em qualquer antologia ou assinar contratos com editoras, procure depoimentos de pessoas que já trabalharam com estes(as) e decidam, em seguida, o que fazer.

    Parabéns pelo artigo e pelo excelente trabalho na Antologia "Monstros Entre Nós", Davi.

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    1. Oi, Adeval. Beleza?

      Obrigado pelo elogios. Creio que acima de tudo, é importante que o próprio participante avalie a sua experiência depois de participar. Infelizmente, muitos saem feridos e só ficam dando murros em ponta de faca por acharem que não há outro caminho.

      Abraços.

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  4. Penso que toda generalização é falha. Há quem diga que antologias são uma perca de tempo, ou apenas um meio de as editoras lucrarem. Que você não vai ganhar notoriedade nenhuma com isso. Porém esquecem de falar em APRENDIZADO.

    Tive sorte em começar a trabalhar, já de início com o Davi Paiva e participar da minha primeira antologia. Digo com segurança que através dele e de outros amigos que fiz durante o processo de escrita para a antologia, melhorei o meu trabalho em 500%.

    De início eu não fazia ideia do quão empenhado esse autor e organizador (Davi Paiva) era, mas ao procurar mais informações sobre outras antologias, vi que o trabalho que ele faz é realmente diferenciado e estou muito satisfeito em fazer parte da Antologia "Monstros Entre Nós".

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    1. Oi, Adeval.

      Agradeço os elogios. Atualmente, o mercado de antologias sofre porque não tem duas coisas: pagamento aos autores e qualidade no livro.
      A primeira parte eu contorno procurando fazer os participantes pagarem menores preços possíveis e arcarem com despesas que possam investir. E a segunda parte, você já sabe...

      Abraços.

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