Grito, Godofredo de Oliveira Neto, 1ª edição, Rio de Janeiro-RJ:
Record, 2016, 160 páginas.
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Por mais que tenha tentado escrever essa resenha pouco depois de concluir a leitura de Grito, foram necessárias pelo menos duas horas e ainda assim elas foram insuficientes para que encontrasse as palavras que melhor descrevessem o novo trabalho de Godofredo de Oliveira Neto, escritor ganhador do Prêmio Jabuti. Geralmente isso acontece com as melhores leituras, mas dessa vez o motivo é bem diferente: apenas não consegui formar uma opinião convincente.

Narrado pela octogenária e ex-atriz Eugênia, Grito conduz o leitor a uma série de experiências vivenciadas por sua protagonista ao lado do jovem Fausto. Em uma espécie de conversa com o leitor, que aparentemente não é o seu único interlocutor, a ex-atriz apresenta o íntimo da relação entre as duas personagens e cria dúvidas sobre os verdadeiros sentimentos que foram despertados através dessa intensa relação de amizade. Como história essa poderia ser apenas mais uma, entre tantas outras, que narram casos semelhantes; como narrativa, o autor surpreende pela maneira como a conduziu.

O primeiro ponto que me fez ficar interessado por essa história foi o fato de ela ser desenvolvida no meio teatral, afinal, cada dia que passa, me vejo mais interessado por tudo o que envolve a segunda arte. Mas tão logo iniciei a leitura, percebi que o teatro não é apenas um mero detalhe na obra em questão. Ele é como o melhor amigo do protagonista, que pode estar sempre em segundo plano, mas que no geral é de extrema importância para todo o contexto e fundamental para o desfecho. O teatro é o que dá vida ao que é lido ao longo dos 21 atos em que a história é dividida; sem ele nada seria possível.

O que prova as minhas palavras é a narrativa escolhida pelo autor. Além de apresentar a narração de sua protagonista, com a simplicidade de uma senhora contando sobre seus medos e anseios, Godofredo de Oliveira Neto optou também por intercalar sua escrita com textos teatrais, alguns inclusive criados pelas duas protagonistas. E isso deu um gás a mais ao enredo, como se fosse o impulso necessário para que a verdadeira essência da obra ficasse clara aos olhos do leitor. E essa essência nada mais é do que a dúvida sobre o que é real ou não nos relatos de Eugênia.

Aí que está o problema: Eugênia é uma personagem tão intensa, tão verdadeira e tão bem construída, que suas palavras muitas vezes acabam dizendo menos do que supostamente deveriam. Não por falha do autor, mas por ela estar presa em uma obra literária e, como tal, sem a chance de ir além do que o autor achou por bem retratar. E confesso que são pouquíssimas personagens que carregam isso com elas, se é que em algum outro momento me encontrei com esse tipo de personagem.

Em compensação, como deixei claro no início, a força da personagem nada me ajudou a definir a minha opinião sobre Grito. Não tenho medo em afirmar que passei a amar sua protagonista, porém não existe um sentimento que defina o que eu sinto pela obra em si. Não posso dizer que amei, embora o seu desfecho tenha me surpreendido quando já não esperava mais ser possível; e não posso dizer que odiei, porque a narrativa muito me agradou. O que posso é afirmar que uma única leitura é insuficiente para se captar tudo o que tem por trás de Eugênia, Fausto e suas aventuras teatrais.
“Acontecimentos ruins e pessoas com reputação diabólica alimentam a sua genialidade. É isso que mais assusta no Fausto. Quanto mais ele nega certas lembranças, mais elas aparecem. O teatro faz bem a ele. Ao fim das apresentações ele parece mais aliviado das suas dores. Viveu todas elas através da linguagem dramática” (pág. 71).

Um Comentário

  1. Olá Ricardo!
    Adorei a resenha deste livro, mesmo que não seja a maior fã de bastidores de vida de atores.
    Beijos!

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