- Decisão -

Os dias passaram e Alice, enfim, pode sair do hospital sem maiores conseqüências do acidente que sofreu. No entanto, para ela teria sido melhor a morte, pois a dor que sentia pela falta de Eduardo era um tormento, não conseguia tirá-lo dos pensamentos e muito menos do coração.
Mesmo com a ajuda de Joana, não estava sendo fácil superar a ausência de Eduardo. Alice havia entrado em depressão e por mais que tentasse se controlar tinha crises de choro e momentos de revolta.
Quando Alice voltou para o hotel e se viu sozinha foi um desespero, os melhores momentos, se é que se podiam dizer melhores, era quando Joana ia visitá-la. Assim que a prima saia e ela ficava em sua solidão, desabava em lágrimas, e um desespero, uma não aceitação de ter lutado tanto por alguém que não fez nada para permanecer ao lado dela.
Mesmo sem conseqüências graves do acidente, Alice não foi mais trabalhar e, pelas faltas, perdeu o emprego. Diego Fontes, seu patrão, foi muito bondoso com ela enquanto esteve no hospital, mas não pode perdoá-la pelas faltas desmotivadas após sua recuperação e, assim, mandou-lhe avisar do cancelamento do contrato.
_ Alice você precisa sair deste quarto_ dizia Joana sempre que ia visitá-la.
Alice evitava abrir até mesmo as cortinas e janelas do quarto, não saia do hotel e ficava numa reclusão:
_ Não tenho para onde ir Jô. Perdi a vontade de viver!_ respondia a prima deitada na cama coberta pelos lençóis.
_ Não pode ser assim, você precisa fazer alguma coisa, tem que sair, trabalhar... Se você se desse uma oportunidade tenho certeza que conseguiria superar esses problemas Alice.
_ Dê-me um tempo Jô, por enquanto eu não consigo fazer nada_ chorou Alice.
_ Já não suporto te ver neste torpor Alice_ confessou Joana_ estou altamente preocupada com você, não é normal.
_ O que eu sentia pelo Edu era muito forte. Ele para mim se constituiu minha vida.
_ Mas... _tentou argumentar Joana_ vocês nem ao menos tinham um relacionamento normal... Se você parasse para pensar, deixar a voz da razão falar mais alto que a da emoção, perceberia que provavelmente esta separação foi o melhor que pode acontecer. Vocês dois eram incompatíveis Alice, primeiro porque você costuma lutar e se entregar por aquilo que acredita e ele não, segundo porque este relacionamento desde o princípio estava fadado ao insucesso e ambos, tanto você quanto ele sabiam desse risco_ respirando um pouco continuou_ às vezes quando fico pensando me sinto culpada pelo que você esta passando, já que de certa forma eu fiz de tudo para vocês ficarem juntos, agora percebo que errei e que jamais deveria ter me envolvido. Queria poder mudar o passado.
Alice passava os dias nesse torpor, nestas crises: jamais poderia se conformar que de tudo o que fez tinha resultado em nada, mas mesmo diante desta inconformação percebeu que dificilmente um namoro dará certo se desde o princípio ele for conturbado.
Eduardo tinha sido um céu e agora estava sendo seu inferno particular, como as pessoas mudavam, como um homem tão fascinante tinha se tornando uma pessoa tão covarde incapaz de lutar por seu amor? Ora, talvez ela não fosse seu verdadeiro amor, no entanto, como não ser, se ele sempre repetia que a amava?
O coração e os pensamentos de Alice verberavam-na incontrolavelmente. Quando as pessoas sofrem tanto elas não são capazes de se controlar e muito menos controlar seus pensamentos, um misto de loucura com ódio se formava, mas não era ódio de Eduardo e sim dela mesma, pois pensava que algo mais poderia ter sido feito para mudar este destino, e culpava-se por não ter feito, por em vez de ter saído correndo e impedido seu amor de partir, tinha pedido para a prima fazer isso, imaginava que se em vez da prima tivesse sido ela a ter aparecido no aeroporto o curso das coisas teriam sido diferentes e provavelmente Eduardo estaria ao seu lado neste momento.
Suposições, meras suposições. Será que teria sido mesmo diferente?
Certa noite, quase um mês após a partida de Eduardo, Alice teve um sonho: ela estava ao lado dele de mãos dadas após uma noite de amor. Acordou gritando. Angustiada chorou pelo fato de aquilo ter sido realmente apenas um sonho. Nunca viveria um momento tão significativo como aquele com Eduardo, não mais. Aquele pensamento fez-lhe doer o coração.
Pela manhã ela resolveu sair da cama, olhou pela vidraça da janela a rua: o dia estava lindo, o sol estava radiante e tinha um pouco de neblina no ar, uma manhã perfeita para dividir com alguém, mas ela não tinha ninguém com quem dividir.
Caminhou até o banheiro e olhando-se no espelho viu uma outra Alice:
Há quanto tempo evitava mirar-se no espelho?
O seu reflexo mostrava uma Alice com cabelos desgrenhados, pálida, com olhos inchados e olheiras profundas.
Quantos anos ela aparentava ter? Provavelmente muito mais do que o que ela realmente tinha.
Alice pensou: "Não agüento mais... talvez seja o mais sensato, ou talvez não... mas será feito".
Caminhou para uma mesinha e tirando alguns papéis escreveu duas cartas uma destinada a Joana e outra a Eduardo. Deixou-as sobre a mesa e foi para a cama.
Alice passou a vista pelo quarto e sentando-se na cama abriu simultaneamente a gaveta da mesinha de cabeceira, tirou um frasco de comprimidos e engoliu algumas cápsulas. Suicídio.
Quando as pessoas não encontram ou não conseguem enxergar uma saída para seus problemas elas optam pela morte achando que assim irão se libertar. Muitas vezes esta 'única' saída é ilusória, pois as pessoas que permanecem sofrem pelo fim da que se foi. O morto não tem mais problemas a resolver, no entanto, deixa muitos a serem resolvidos.
Por volta do meio-dia daquele trágico dia, Joana foi visitar a prima, chegando ao quarto, após chamar insistentemente pela prima e não obter resposta alguma, foi a recepção perguntar pela prima:
_ Não ela não saiu do quarto, como sempre, ela nunca sai_ respondeu a moça que estava atrás do balcão.
_ Alguma coisa deve ter acontecido, pois Alice não me responde_ desesperou-se Joana_ precisam abrir aquele quarto!
Joana explicou o estado da prima e temerosa implorou para que pegassem a chave reserva e abrissem o quarto.
Assim o fizeram.
Ao abrirem aporta Joana viu Alice deitada na cama e correu para a prima que já estava inconsciente. O gerente do hotel chamou uma ambulância.
Joana viu o fraco do remédio na cabeceira da cama e chorando desesperadamente ficou esperando a ambulância.
Os hóspedes começaram a se aglomerar diante da porta do quarto.
O gerente viu as cartas sobre a mesa e entregou-as para Joana, que distinguiu, entre as lágrimas, seu nome e o de Eduardo.
A ambulância chegou e rapidamente removeu Alice do hotel, levando-a para o hospital.
Na sala de espera, muito angustiada Joana lembrou-se das cartas, abriu a bolsa e pegou a que era destinada a ela, entre lágrimas, leu:

Joana,
Sinto muito.
Estou desesperada e não vejo mais motivo para que eu continue viva, para mim, em particular, já não vivo desde a partida de Eduardo e sei que por mais que tente, não poderei mais recuperar minha vida de volta, jamais terei vontade de me apaixonar, trabalhar, entre outras coisas que as pessoas normais fazem, perdi o gosto para tudo isso.
Errei por ter entregado minhas esperanças e minha vida nas mãos de Eduardo, mas  pensava que seriamos felizes e, se antes não havia tomado a decisão que hoje tomei, foi porque, mesmo sem querer assumir em voz alta, tinha esperanças de que ele se arrependesse, reconhecesse o erro e voltasse para meus braços e outrossim me levasse embora com ele.
Jô responda-me, se puder, de que vale viver sem ter o amor? De que vale a vida se você perdeu o gosto de viver? Será que vale a pena viver sem a felicidade?
Não quero que me julgue inconseqüente, nem que tente compreender o incompreensível, pois determinadas coisas só são compreendidas quando vividas pessoalmente e eu, não quero que você viva isto que vivi.
Para mim não vale a pena viver sem ter o amor, não vale a pena ser infeliz a vida inteira só porque viveu alguns momentos de felicidade ao lado de quem você ama, mas que sabe, jamais poderão se repetir.
Não quero que culpe Eduardo pelo que eu fiz, ele não tem culpa. Ele me queria ver viva e feliz, mas eu percebi que não há vida longe dele, viver sem tê-lo do meu lado é comparado à morte. Mesmo ele distante de mim continuo amando-o com a mesma intensidade e mesmo após a morte sei que continuarei amando-o.
Saiba Jô que não estou me justificando ao expressar através de palavras o que estou sentindo, só queria que você soubesse todos os dilemas e inseguranças pelos quais tenho passado, para assim você não me julgar com tanta brutalidade.
Dessarte, quero agradecer por tudo o que você fez por mim, por ter me defendido ao máximo dos seus pais, por ter me ajudado com o Edu, enfim, não encontro palavras para expressar o quanto te agradeço.
Jô, sobre meus tios, diga-lhes que embora eles tenham me ajudado diante da morte de meus pais, queria que eles tivessem me ajudado com o Edu e não terem sido tão contra, pois foi culpa deles eu ter sofrido tanto e não ter vivido meu amor, mesmo assim, não guardo mágoa, porque me dei conta que eles devem ter tido seus motivos para me odiarem tanto, motivos este que ignoro.
Obrigado, Joana amo muito você e sei que pode não concordar com minha decisão, mas espero que consiga ao menos aceitá-la, pois estou em paz agora.
Sei que é patético pedir para que não sofra pela minha morte, mas veja pelo meu lado Joana, não tinha, mas sentido viver, eu estava uma morta-viva...
Por último, queria te fazer um pedido, quero que tente ao máximo enviar a carta que deixei para Eduardo, gostaria muito que ele a recebesse e lesse.
                                                                                                  Ass.: Alice.


Joana ficou desesperada, lágrimas escorriam por seu rosto incontrolavelmente.
Os médicos vieram até ela e informaram que não podiam mais fazer nada por Alice, ela havia morrido.


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Capítulo 9

Autora: Camila Márcia V. Ferreira nasceu em Fortaleza (CE), atualmente reside em Bela Cruz, interior do estado, faz faculdade de Letras pela Universaidade Estadual Vale do Acaraú (UVA) e é a Bloggeira de Devaneios Fugazes.
Entrar em contato: E-mail: kmylla_m@hotmail.com Twitter: @camila_marcia

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